A difícil tarefa de enviar e receber uma mota no Brasil

Viajar de mota tem as suas particularidades logísticas! Habituados a preparar viagens pela  Europa e ainda uma viagem por Marrocos, há muita coisa que assumimos como certa, a bagagem, os documentos normais, B.I. ou passaporte, seguro de viagem e das motas, rotas, os passeios e a sensação de que sempre que se começa a rolar o corpo e a mente se vão relaxando e adaptando a cada dia que passa.

Quando, por outro lado o objetivo é viajar no outro lado do oceano a coisa muda de figura. No início deste ano de 2014, contactámos uma empresa para tratar de toda a logística que pressupõe o envio das duas motas para o Brasil. Os meses foram passando entre contactos periódicos por telefone entre Barcelona e Lisboa. Quando viemos para Portugal, depois de fechar um ciclo na absorvente Barcelona, apercebemo-nos realmente de toda a parafernália que implicava o simples envio das motas. Sendo claro que o envio por avião seria incomportável, fomos avançando com a preparação do envio marítimo. Tínhamos consciência que levaria muito mais tempo do que desejaríamos mas, era uma condicionante que tínhamos que assumir. Interiorizado este facto, começou a epopeia e o teste de resistência, de resiliência, conceito este de que só agora conhecemos o seu contorcido significado. Para nossa inquietude não foi com a primeira empresa, mas sim com a segunda que logramos fazer todo o processo de envio.
Neste processo aprendemos, sob pressão, o significado de gruparem, BL, portos e alfândegas e as suas embrulhadas burocráticas. Foi difícil de processar que, à beira do envio de duas motas para o Brasil, depois de conseguir fazer caixas, ter as duas motas com revisão especial de mecânico feita e todo o material num prazo record de um mês , de repente, no dia anterior ao envio ter ficado tudo cancelado, acabar até mesmo a relação com a empresa até ali contratada porque, só naquele momento, a empresa transportadora decidiu comunicar que o barco para Salvador passaria antes por São Paulo e que se enviássemos as motas em grupagem teríamos que estar no porto de Santos para fazer pessoalmente todo o processo de desalfandegar e alfandegagem de novo para Salvador!!! Não queríamos acreditar no que nos estavam a dizer, supostamente eram pessoas entendidas no assunto… … As motas tinham que entrar em Santos e voltar a sair para chegar a Salvador??? É como se uma carta que envias para um determinado endereço tivesse que ir primeiro para outro, ser aberta, lida, fechada de novo para finalmente seguir e ser entregue no endereço a que se destinava… Tudo isto acompanhado pela a mesma ladainha: “fazer envio de barco para o Brasil??? Ufff… que complicado, o que querem fazer é demasiado trabalhoso e sem garantias de sucesso… não se metam nisso!!!”

Na verdade, se fôssemos atrás dessa ladainha, teríamos acabado por sair de Portugal por terra, ao sabor do vento… mas e apesar de todas as complicações, todos os sins, mas afinal nãos, de todo o avançar e recuar, continuámos firmes na vontade de conhecer o sabor do vento do outro lado do Atlântico.
No final daqueles dias menos positivos, em que todas aquelas contrariedades nos davam vontade de baixar os braços, a nossa resiliência levava-nos a continuar. A nossa força há que dizer aqui, vinha e vem em grande parte da família, dos amigos de sempre e também de pessoas que graças a este nosso louco projecto temos tido o prazer de conhecer. A força, o apoio, não nos chegou só por palavras, mas também quando nos faziam comida e pensavam nas coisas práticas do dia a dia, porque, para nós, as horas dos dias e das noites se misturavam facilmente; quando às tantas, depois de estar dias à procura da ferramenta correcta, ou da peça ou suporte que não chegou a tempo ou não funcionava, havia sempre um par de mãos e uma atitude positiva a ajudar; quando a burocracia parecia interminável e falada numa língua inumana havia sempre quem descomplicava, se sentava ao nosso lado, escutava as nossas vozes nervosas e nos fazia ver as coisas com o devido distanciamento; quando depois de dias e dias enfiados  nos  meandros da organização do Zarpando nos levavam a dar uma volta e a fazer uma pausa.
 Agora, já deste lado e com a certeza de que as motos chegaram à Baía de Todos os Santos enfrentamos a espera, imposta pela burocracia de cá, entre sabores, temperaturas e cores distintas, tropicais! Acreditando que se chegámos até aqui, não pode haver volta atrás. Vamos digerindo, ao vivo, os contornos de uma realidade, até hoje, só conhecida através dos livros e da música.
 Neste momento, Salvador (que estamos a adorar visitar) é a fronteira que nos separa da próxima curva da estrada desconhecida, das estradas que até agora só percorremos com a ponta dos dedos… Estamos ansiosos! O km 0 continua marcado no nosso contador interno à espera, do sinal da bandeira dos quadradinhos, para zarpar “sacolejando”.

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